(Texto resumido do livro Crianças no labirinto das acusações - Falsas Alegações de Abuso Sexual da Doutoranda em psicologia Marcia Ferreira Amendola – Ed. Jurua - 2009)
Parte 3 - A fidelidade da criança ao acusador: coação e falsas memórias
Alaggia (2004), apoiada em outras investigações(*), identificou uma variedade de formas de se revelar um abuso sexual sofrido que corroboram os estudos de Schacter (2003) e Bruck, Ceci e Shuman (2005). A autora ressalta que não há um modelo padrão, foi uma revelação de abuso sexual deriva de fatores como: desenvolvimento humano, memória e ambiente. Ressalta, no entanto, ser pouco provável que crianças com menos de seis anos de idade realizem uma revelação em função de fatores ligados ao seu desenvolvimento.
Quando a criança realiza uma revelação, Gonçalves (2004b) explica que o relato do abuso sexual tende a ser meramente factual:
“A carga emotiva do abuso sexual, em uma porcentagem importante dos casos, é trazida mais pelos adultos significativos que pela própria vivência da criança, que muito freqüentemente, nem é capaz de sexualizar o ato abusivo. Ela inda não é capaz de representar o incesto” (GONÇALVES, 2004b, p. 53).
Assim, de acordo com essas pesquisas, a produção da verdade, pelo testemunho da criança, pode estar asociada, diretamente, a vários tipos de pressões sociais “em uma tentativa de extrair informações das recalcitrantes crianças em idade pré-escolar” (SCHACTER, 2003, p. 168). Fato pelo qual summit (1992), contradizendo-se, admite que a criança possa mentir apenas para proteger (ou agradar) uma pessoa na qual depende afetivamente.
Trazendo essa discussão para o cenário da separação conjugal, contexto em que muitas alegações de abuso sexual entre pais e filhos eclodem, podemos supor que a criança pode tanto manter-se fiel às alegações da mãe-guardiã que acusa o ex-companheiro, confirmando ou revelando o abuso (que nunca ocorreu), quanto pode negar o abuso sexual para proteger o seu agresor. Ambas as alternativas são viáveis, se considerarmos a explicação do autor, dependendo apenas de quem a criança irá estabelecer vínculos de lealdade. No entanto, para Chauí (2000), os vínculos de lealdade podem ser forçados.
“[...] poderia acontecer que para forçar alguém à lealdade seria preciso fazê-lo sentir medo da punição pela deslealdade, ou seria preciso mentir-lhe para que não perdesse a confiança em certas pessoas e continuasse leal a elas [...] esses meios desrespeitam a consciência e a liberdade da pessoa moral, que agiria por coação externa e não por reconhecimento interior (p. 435)
Do ponto de vista que a criança pode mentir na intenção de agradar o adulto, entendemos que el apode acrescentar ou fazer comentários fantasiosos (dada a riqueza imaginativa própria do período de desenvolvimento infantil) tanto para atrair a atenção do profissional que realiza a entrevista quanto para agradá-lo. Na concepção de Ceci, Buck e Rosenthal (1995, p. 506): “após prolongadas perguntas sugestivas sobre tocar seios, urinar em cima de cada um, etc., na é de se surpreender que algumas crianças comecem a perceber a discussão de temas sexuais como não apenas aceitável, mas realmente desejável.
De Young (1986), Gardner (1991) e Cárdenas (2000) analisam que, mesmo não havendo intencionalidade no relato da criança, seja porque ela reproduz o que um adulto de sua confiança tenha lhe instruído a dizer ou a acreditar, seja porque o adulto esteja convencido de que a criança foi abusada, devemos ter a cautela com declarações do tipo crianças nunca mentem. Também devem ser tomadas com certa reserva e cuidado afirmações que defendem que as crianças não são capazes de fabricar histórias de abuso sexual, como argumentou Summit (1983). Ele próprio, anos mais tarde, veio a admitir que a criança é capaz de mentir.
De acordo com Maluf, vice-presidenta da Associação Brasileira de Psicopedagogia, em reportagem á Revista Escola (2004), a criança (até os eis anos de idade), do ponto de vista cognitivo, não possui desenvolvimento capaz de diferenciar um engano intencional (mentira) de seus jogos de faz-de-conta (fantasia), ou se o que lhe transmitem é verdade ou mentira do ponto de vista factual. Pata a psicopedagoga, a criança, até essa idade, não tem um compromisso com a realidade.
Mediante essas explicações, podemos compreender que é com certa facilidade que a criança toma por verdadeiras as histórias contadas pelos pais, desde mentiras socialmente aceitas, como a crença no Papai Noel, até aquelas envolvendo maus-tratos.
Nesse sentido, Gardner (1991) é contumaz ao afirmar que os profissionais, que buscam na palavra da criança a verdade factual para a comprovação de um abuso sexual, negligenciam o fato de que os filhos são influenciados pelos genitores, especialmente pelo genitor-guardião (mãe) que geralmente é o responsável pela acusação e intenção de afastamento de pais e filhos. O autor explica que, no caso de haver litígio, o genitor-guardião seria capaz de programar os filhos para acreditar em uma história de maus tratos e violência. Critica, ainda, o processo utilizado por esses profissionais na avaliação de crianças menores de cinco anos quanto ao entendimento sobre conceitos de verdade e mentira, dada a falta de respaldo científico e metodológico.
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