segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Recebimento de denúncias falsas preocupa a polícia

Nos últimos 30 dias, o Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítimas de Crimes (Nucria) recebeu 40% mais denúncias do que o normal. Segundo o órgão, isso é motivado pela repercussão dos casos de pedofilia na mídia desde o início do mês. Apesar de a população estar encorajada a denunciar mais, a atitude está preocupando a polícia, já que 80% das denúncias recebidas nesse período são falsas.

Segundo a delegada Eunice Bonome, do Nucria, algumas pessoas têm aproveitado para fazer denúncias infundadas. A maioria dessas queixas envolve brigas de casal em processo de separação, intrigas de vizinhos e vingança pessoal.
“Muitas das denúncias falsas são apenas para prejudicar outras pessoas. E quanto mais grave ela é, maior é a chance de ser infundada. Por isso, precisamos tomar muito cuidado com as informações que chegam até nós”, explicou Bonome.

Desgaste


Como todas as denúncias que chegam ao Nucria são checadas, o aumento de informações têm causado desgaste desnecessário às equipes de investigação. Para a delegado, isso gera constrangimento a várias pessoas, trabalho em excesso aos policiais envolvidos, deslocamentos desnecessários, perda de tempo - precioso para verificar casos verdadeiros e mais urgentes - e um alto custo operacional (gasolina, telefone, etc.).

Antes dessa avalanche de informações falsas, o Nucria enfrentou bastante trabalho. Apenas neste ano, foram 682 boletins de ocorrência registrados, metade deles relativos a violência sexual e doméstica e a delitos como ameaças, lesão corporal, atentado violento ao pudor e estupro. Até outubro, foram cumpridos 26 mandados de prisão preventiva e feitas 20 prisões em flagrante pela Policia Militar e pela Guarda Municipal.

domingo, 1 de agosto de 2010

PROBLEMATIZANDO O TEMA DA (FALSA) DENÚNCIA DE ABUSO SEXUAL CONTRA A CRIANÇA

O Depoimento

Marcia Ferreira Amendola

Doutoranda em Pscologia Social do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - PPGPS/UERJ.

Diante das dificuldades para estabelecer a materialidade baseada em evidências físicas ou comportamentais, nos casos em que se alega a ocorrência de abuso sexual contra a criança, o depoimento desta última tem adquirido status de matéria probatória na processualística civil e penal, a despeito das reservas impostas por fatores pertinentes à condição especial de pessoa em desenvolvimento. Desta forma, a palavra da criança, se harmônica com as demais provas dos autos, vem sendo amparada pela jurisprudência, a partir da compreensão de que os crimes contra os costumes, normalmente ocorrem na clandestinidade, sem testemunhas.

Tal fato tem possibilitado a articulação entre a Psicologia e o Direito, no qual o profissional psicólogo, ao procurar atender à demanda do poder judiciário pela produção da verdade a respeito de um fato ou fenômeno (Miranda Jr., 1998) , vem operando na busca pela revelação do abuso sexual.

O termo revelação, portanto, ganhou aspectos de intervenção – realizada por profissionais de Psicologia e de Serviço Social no trato com crianças, supostamente, vítimas de abuso sexual - a qual denominou-se Entrevista de Revelação ou Estudo de Revelação. De acordo com os autores estudados, essa técnica tem por objetivo criar um ambiente facilitador que permita à criança revelar o abuso sexual a partir da produção discursiva, lúdica e gráfica, sem desenvolver sentimentos de culpa ou vergonha. Furniss (2002, p.177), ao descrever essa técnica de revelação, demonstra certa tendenciosidade no trato das questões relativas à prática profissional em casos de suspeita de abuso sexual, pois o autor orienta os profissionais

a iniciar a entrevista com a "permissão terapêutica explícita pra revelar".

Isso significa que o propósito do psicólogo durante a entrevista é, necessariamente, fazer com que a criança relate o abuso sexual, presumidamente, sofrido. Segundo Furniss (2002, p. 177), é preciso enviar, de maneiras variadas e repetidas, a mensagem: "Eu sei que você sabe que eu sei." Ao final de todas as considerações, se a criança ainda não estiver motivada a revelar, o autor argumenta que ela posa estar assustada demais, provavelmente, por ameaças do abusador ou possa estar resistente. Apesar de declarar que é preciso estar atento para o fato do abuso sexual não haver ocorrido, Furniss (2002) insiste que o profissional não deve aceitar quando a criança nega a ocorrência do abuso, considerando que a negação seja consequência das ansiedades e medos desta em revelar. Seguindo essa lógica, o autor sustenta que, mesmo quando o silêncio da criança persiste, o profissional deve se antecipar e presumir a alegação de abuso sexual como verdadeira. Na análise do autor, o ato de insistir para que a criança revele o abuso sexual se justificaria, pois estaria baseado na crença de que as crianças que negam a ocorrência do abuso sexual podem estar mentindo. Contudo, o autor admite que a criança possa mentir ao revelar um abuso sexual, acusando, falsamente, um membro da família.

Trata-se, seguindo essa lógica, de uma situação em que, apesar da não ocorrência do abuso, o adulto responsável por seu atendimento não outorga legitimidade às palavras da criança, apenas quando estas palavras correspondem à confirmação do suposto abuso - essencial para o sucesso da entrevista de revelação.

Posicionamentos contrários ao de Furniss (2002) foram levantados por Bruck, Ceci e Shuman (2005), a partir de resultados obtidos de uma série de pesquisas por eles analisadas. Os autores declararam que, se a revelação da criança transcorrer na forma de pequenos fragmentos promovidos por entrevistas diretivas ou jogos de representação, nos moldes que Furniss (2002) sugere, os autores acreditam que essa posa se dar como resultado de um processo de sugestão, portanto, suscetível a distorções.

Tal conclusão também foi sustentada por Schacter (2003), pesquisador que analisa possíveis causas, consequências e imperfeições da memória. Para o autor, as respostas de crianças a perguntas específica - em que, não raramente, recebem elogios pelos entrevistadores quando a informação desejada é presenteada e desapontamento e reprovação quando as crianças não respondem de acordo com o esperado - não podem ser interpretadas como recordação de uma situação e abuso sexual. Diante desse processo, a criança poderia ser conduzida pelas expectativas e crenças do profissional entrevistador.

Ainda de acordo com essas pesquisas, a produção da verdade, pelo testemunho da criança, pode estar associada, diretamente, a vários tipos de pressões sociais, no qual se admite que a criança possa mentir para mentir ou agradar uma pessoa da qual depende afetivamente. Sendo assim, nas circunstâncias de separação conjugal, é possível supor que a criança pode se manter fiel às alegações da mãe guardiã que acuso o ex-companheiro, ao invés de apenas negar o abuso para proteger o seu suposto agressor. Ambas as alternativas são viáveis, se forem consideradas as explicações dos autores, dependendo apenas de quem a criança protege ou quer agradar, ou seja, de quem a criança irá estabelecer vínculos de lealdade.

Leia na íntegra em:

http://www.revispsi.uerj.br/v9n1/artigos/pdf/v9n1a16.pdf