Fonte: G1 / Fantástico - TV Globo
Procuradora teria feito falsas denúncias de pedofilia para adotar outro bebê Vera Lúcia Sant’Anna Gomes, já apresentava sinais de desequilíbrio emocional em 2008 e havia tentado manobra para tirar bebê de uma mãe que desistiu de dar a filha para adoção. A 1ª Vara de Infância e Juventude - RJ, lhe deu a criança mesmo sabendo disso.
Tudo leva a crer que coisas horrorosas aconteciam dentro de um apartamento em Copacabana. Uma gravação que teria sido feita dentro do apartamento mostra um dos momentos de agressão. A voz seria da procuradora, e o choro, da menina adotada por ela pouco mais de um mês antes.
- Maluca! Engole! Você vai comer tudo, entendeu? Sua vaquinha! Pode chorar! Sua cachorra! - grita, supostamente, Vera Lúcia.
“A garotinha ficava o tempo todo tremendo e não podia chorar. Se chorasse, levava na cara novamente. Eu achava que ela ia matar a garota e a culpa ia ficar na gente, que era empregada”, diz uma ex-empregada da procuradora aposentada Vera Lúcia Sant'Anna Gomes.
“Ela apanhava mais no rosto”, revela outra ex-empregada da procuradora.
“Ficou constatada a multiplicidade das lesões. As lesões ocorreram em datas diferentes, em um período de 30 dias. Elas ocorreram diversas vezes, por meio cruel”, diz a delegada Monique Vidal.A autora dessas atrocidades, segundo a polícia, é a procuradora aposentada Vera Lúcia Sant'Anna Gomes. A vítima, uma menina de 2 anos entregue à procuradora pela 1ª Vara da Infância, Juventude e Idoso do Rio de Janeiro para adoção.
A aposentada Vera Lúcia tinha conseguido a guarda provisória e o direito de ficar com a menina em casa enquanto aguardava a adoção definitiva. Mas essa não era a primeira vez que a procuradora tentava conseguir uma criança. E a Justiça sabia disso! A 1ª Vara da Infância e Juventude sabia também que havia relatório feito na DECAV (Delegacia de Criança e Adolescente Vítima) asseverando que ela já apresentava sinais de desequilíbrio emocional e que ela havia feito na polícia denúncias falsas para tentar tirar o bebê de uma mãe que desistiu de dar a filha recém-nascida para adoção.A história começou em 2008. Uma moça estava grávida e pretendia dar o bebê. “Eu estava com dificuldades, sem trabalhar, e meu marido também. A gente decidiu”, conta.
Foi a dona de casa Valéria Lima de Morais quem procurou uma família para adotar o bebê.
“Eu perguntei ao meu massoterapeuta se ele não conhecia alguém que quisesse adotar, mas que tratasse bem. Ele indicou a doutora Vera Lúcia Sant'Anna Gomes e disse que ela realmente procurava, que ela criava cachorros e gatos e adorava crianças”, lembra Valéria.
“Estava mesmo decidido que ela adotaria minha filha de verdade. Foi quando a menina adoeceu. Ela passou uma semana no hospital e eu me apeguei. Então, decidi não entregar mais minha filha”, conta a mãe. “No dia seguinte à da alta da criança, a doutora Vera Lúcia foi ao hospital e tirou toda doação que tinha feito de roupas, fraldas e lençóis para o bebê. Mandou que a enfermeira tirasse a roupa e a fralda do bebê e deixou o bebê totalmente nu”, lembra Valéria.
Não demorou muito para Valéria e a mãe do bebê voltarem a ter notícias da doutora Vera Lúcia.
“Eu estava na praia quando a minha empregada me ligou dizendo que havia dois policiais na minha porta com uma ordem de prisão para mim”, conta Valéria. “Passados uns dias, policiais foram à minha casa”, diz a mãe do bebê. “Me chegou às mãos essa denúncia, através de uma carta de próprio punho, manuscrita por ela, de aproximadamente 30 ou 40 páginas”, relata Maria Aparecida Mallet, ex-titular da DCAV, do Rio de Janeiro.
“Foi quando a delegada me informou que a denúncia era de que eu fazia tráfico de órgãos, era pedófila e vendia crianças para pedofilia”, relata Valéria.
“Começamos a investigar e percebemos que não era bem isso. Na verdade, essa denúncia era uma manobra dela para ter a criança mediante uma fachada de legalidade. Para que a polícia pedisse uma busca e apreensão da criança e então fizesse a parte dela, que era solicitar a posse e guarda provisória da criança”, diz a delegada Maria Aparecida.
A investigação concluiu que as denúncias eram falsas. Um documento com esse resultado e com o relato da tentativa frustrada da procuradora de ficar com o bebê foi entregue à Justiça.
“Foi encaminhado cópia de todo o procedimento, de toda a investigação, de todo o apuratório, à 1ª Vara da Infância e Juventude, bem como ao Conselho Tutelar”, assegura a delegada Maria Aparecida.
No relatório final, há uma frase do massoterapeuta que confirmou a história, mas não quis gravar entrevista. Ele diz que a doutora Vera Lúcia estava em desequilíbrio emocional extremo.
“Se a 1ª Vara da Infância e da Juventude sabia disso, como deixou ela pegar uma criança?”, pergunta Valéria.
A juíza Dra. Ivone Ferreira Caetano, juíza titular da 1ª Vara de Infância e Juventude do Rio de Janeiro, se defende alegando: “Não é só a avaliação da minha vara. Há também a avaliação dos profissionais da instituição de abrigo. E todos foram unânimes em dizer que ela era uma pessoa apta a fazer aquela adoção.”
O grave é que a Dra. Ivone Ferreira Caetano, que concedeu a guarda provisória, se baseou errôneamente APENAS nos laudos produzidos pela citada entidade e não deu a devida atenção aos documentos que comprometiam a conduta psicológica e sobre o caso da recém-nascida de um ano antes. Outro fato é que a 1ª Vara da Infância e Juventude é quem credita essas instituições a fazerem as avaliações, sem se preocupar com a qualidade técnica-científica dos profissionais e dos relatórios produzidos.
Ao denunciar pessoas que ela sabia inocentes, a procuradora Vera Lúcia teria cometido um crime de denunciação caluniosa, que dá entre dois e oito anos de prisão. Mas a delegada foi transferida, o inquérito, arquivado, e a procuradora nunca foi investigada.
A delegada Monique Vidal, da 13ª DP (Ipanema), encaminhou nesta sexta-feira ao Ministério Público o pedido de prisão preventiva da procuradora aposentada Vera Lúcia Gomes, de 66 anos, indiciada por crime de tortura qualificada e racismo. O pedido deve ser analisado na segunda-feira pela promotora Marisa Paiva, que vai avaliar os autos e decidir se o encaminha ou não à Justiça. A procuradora foi acusada por uma denúncia anônima de agredir a filha adotiva de dois anos e agir de forma discriminatória com as empregadas domésticas.
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